Por Jonas Chaves
O livro do profeta
Obadias traz um tema que é evidente em todas as Escrituras, a saber, o do amor
especial de Deus pelo Seu povo eleito. Este amor inexplicável e imenso faz com
que Ele nunca vacile no cuidado com Seu povo. Este, por sua vez, a despeito de sua
constante infidelidade, é sempre objeto da maravilhosa graça divina, devendo
ser grato por este motivo.
Este
livro, que foi escrito por volta do final do século VI a.C., está inserido em
um contexto onde o povo de Israel havia sido oprimido pelos edomitas, que
descendem de Esaú. O livro faz um contraste entre a descendência de Esaú e a de
Jacó, os quais simbolizam Edom e Israel, respectivamente. Isto indica que a
relação entre estes dois povos era tensa, assim como no caso dos personagens
aludidos.
A
profecia deste livro, longe de estar obsoleta, fala fortemente para a Igreja de
hoje. E o faz de uma maneira consoladora. Parece que às vezes se enfatiza muito
o fato de Deus ser justo, irado contra o pecado e o soberano punidor do mesmo.
Estas coisas são verdadeiras e devem ser pregadas na Igreja, porém há mais do
que isso no Deus da Escritura, e estas coisas também precisam ser ensinadas. O
Deus da Bíblia também é o Deus amoroso e benevolente, que se agrada em livrar o
Seu povo da opressão do inimigo. O último dia, o dia da consumação de todas as
coisas, será a expressão maior desta verdade.
Veremos
com a exposição deste livro como Deus abate a nação mais poderosa, o povo mais
fortificado e os homens mais cruéis que possam existir a fim de prover salvação
e resgate para os Seus. O Deus que se ira contra o Seu povo, que pune
severamente seus pecados e que o castiga, é também o Deus que se agrada em dar
livramento e graça para estes privilegiados. Tudo isto ficará patente à medida
em que estudarmos este edificante livro.
Possa
o Senhor ser servido em edificar o corpo de Cristo através da exposição do
profeta Obadias. Que a Igreja consiga extrair do seu conteúdo o que há de mais
sublime, a fim de encontrar nele consolo para o coração e alento para a alma.
2.
UM TERRÍVEL ORÁCULO DE DEUS CONTRA OS INIMIGOS DO SEU POVO
2.1
O ANÚNCIO DO JUÍZO CONTRA EDOM
O texto que estamos considerando está
inserido em um contexto histórico. É pertinente destacarmos este contexto. A
maioria dos estudiosos data o livro entre os anos 587 e 586 a.C., tempo em que
Jerusalém foi destruída.
O
oráculo é dirigido contra os edomitas em razão de terem eles participado deste
evento. O Salmo 137.7 indica o ódio que Edom nutria contra Jerusalém, o que a
levou a participar da destruição daquela cidade. Porém, em decorrência desta
atitude ímpia para com o povo de Deus, um terrível juízo estava por vir.
O
profeta Obadias recebe uma revelação divina. Esta revelação, que se dá em forma
de visão (“visão de Obadias”),
credencia todo o livro como autoritativo e divinamente inspirado, uma vez que
ela procedia de Deus. A palavra visão (hebraico: hazon) é um termo clássico no Antigo Testamento que aponta para a
natureza revelatória da mensagem recebida.
Esta
visão corresponde à Palavra de Deus. A prova disso é a declaração
seguinte de Obadias. Ele introduz o tradicional “Assim diz Yahweh”, tão comum nos livros da velha aliança. Isto
confirma a procedência divina da mensagem. Aliás, esta é uma marca distintiva e
característica de um verdadeiro profeta de Deus. Muitos têm se levantado com
esta prerrogativa, todavia o conteúdo de suas mensagens os denuncia como falsos
profetas.
E o que a voz de Deus dizia ao profeta? A
fala divina é “a respeito de Edom”.
Quem eram os edomitas? Eles eram os descendentes de Esaú, que era irmão de
Jacó, de quem descendem os israelitas. Isto significa que, assim como Esaú e
Jacó eram irmãos, Edom e Israel eram povos “irmãos”. No entanto, apesar da
proximidade entre estes povos, a relação entre eles não era nem um pouco
amistosa. Mais adiante veremos as razões que explicam isto.
Seguindo
com o texto, o profeta diz: “temos
ouvido as novas de Yahweh”. Deus tinha um recado para entregar a estes dois
povos (Israel e Edom). Pelo fato de o verbo estar no plural (temos), Calvino
entende que Obadias fala em nome de outros profetas. O anúncio que estava por
vir era o do juízo que havia de vir sobre Edom por causa do que fizeram contra
Israel.
Quem
estava levando esta mensagem era um “mensageiro”
que havia sido enviado. Citando mais uma vez o reformador Calvino, ele traduz o
termo mensageiro como “embaixador”.
Já W. Ward Gasgue prefere a tradução “arauto”, e até cogita a possibilidade de
se tratar de um anjo. Podemos entender de qualquer uma das
formas, pois mensageiro, embaixador e arauto são a mesma coisa. E, além disso,
quer tenha sido um outro profeta, quer um anjo, o fato é que Deus usou a
instrumentalidade daquele seu servo para fazer a sua soberana voz ser
ouvida.
O
Mensageiro tinha algo a dizer. O anúncio que ele faz é uma convocação que tem
um objetivo, o qual ele menciona com toda clareza. Ele chama para que se
levantem “para a guerra”. Estava
declarada a guerra contra o povo opressor dos israelitas. A maldade desse povo
estava prestes a ser punida. Uma vez que esta mensagem tenha vindo direto da
boca de Deus, é óbvio concluir que o próprio Deus era quem estava estabelecendo
esta guerra. Calvino diz desse texto que “o profeta revela que guerras não são
suscitadas por acaso, mas pela secreta influência divina”.
O
povo de Israel tinha um inimigo declarado e muito bem definido pelo próprio
Deus: Edom. Esta nação era distinta pela sua soberba. O Dr. Russel Shedd diz
que os profetas (como Amós, Isaías, Jeremias, Ezequiel e outros) “chamaram a
atenção para a atitude de auto-suficiência e orgulho de Edom, como raiz de seu
pecado.” Isto era acentuado pelo fato de que Edom localizava em uma região
montanhosa (v.3). Ele supõe também que era uma nação de difícil penetração, e
cita os versos 6 e 7 como indicando que Edom só podia ser vencida com base em
uma traição.
Porque
Edom havia destruído o povo de Deus e se ensoberbecido grandemente, estava
agora prestes a virar ruína. Eles estavam ouvindo algo que era temido por todas
as nações que conheciam a fama de Yahweh, o Deus de Israel: o anúncio do juízo
de Deus. Veremos agora que algo levou os edomitas a destruírem e a zombarem da
nação de Judá.
2.2
A SOBERBA DE EDOM É A CAUSA DA SUA RUÍNA
O mensageiro identifica o problema
moral da nação edomita como sendo a soberba. Deus a atinge exatamente naquilo
em que ela se engrandece. A soberba era uma marca deste povo. Wiersbe comenta
que “assim como as águias, os edomitas viviam nas rochas e olhavam do alto com
desdém para as nações a seu redor.”
Quantos
exemplos não conhecemos semelhantes ao de Edom? Muitas foram (e hoje ainda é
uma realidade) as nações que caracterizaram-se pela soberba. O interessante da
história é que as semelhanças não se limitam à atitude soberba, mas também ao
fim que tiveram. O fim trágico para nações ímpias também será uma realidade
futura. Tiago nos lembra que “Deus
resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes” (Tg. 4.6).
O
mensageiro diz no verso 2: “Eis que te
fiz pequeno entre as nações; tu és mui desprezado.” O dicionário Vine diz
que “pequeno” (heb. katan), na sua
forma verbal, significa “diminuir, ser insignificante” Isto certamente constituía-se num
golpe no orgulho desse povo. Como um mensageiro poderia dizer que uma nação tão
exaltada e elevada acima das outras (até mesmo geograficamente) havia sido
inferiorizada? Será que este mensageiro estava em seu juízo perfeito quando
proferiu esta sentença, uma vez que Edom pisoteada seus oponentes?
Logicamente
a palavra do profeta não poderia estar equivocada, pois era a palavra de Deus
(v.1). O fato é que o Deus de Israel é o Deus que destrona o maior dos reis da
terra, reduzindo-o a monturo. Não há poderoso diante dele. Não há quem possa
escapar de suas mãos poderosas, elas têm um alcance ilimitado (Is 43.13). Às
vezes parece que a Igreja esquece-se do atributo do poder ilimitado de Deus e,
na sua prática de vida, zomba disto. Vive de maneira orgulhosa e soberba.
Muitos cristãos têm, por isso, experimentado a “resistência” de Deus de que
fala Tiago, e isto não de forma injustificada.
O
profeta então mostra a fragilidade da confiança exacerbada dos edomitas em sua
pretensa superioridade sobre as outras nações. Diz ele que os edomitas foram
enganados pela sua soberba, no verso
3, destacando mais uma vez esta qualidade negativa deste povo.
O
verso 3 é uma radiografia do coração de Edom. Tal radiografia revela que o
câncer da soberba havia se espalhado. E da mesma forma que um câncer tem o
poder de levar as pessoas à morte, a soberba deste povo estava prestes a
levá-los à destruição. Este povo habitava “nas
fendas das rochas”, numa “alta
morada”. Esta posição geográfica fazia com que Edom prevalecesse contra
seus inimigos. Mesmo assim Deus promete destruí-la.
De
forma desafiadora, Edom dizia: “quem me
deitará por terra?”. Para a decepção deste povo, havia um que era capaz de
deitá-lo por terra. O Todo-Poderoso iria levantar-se do seu trono para executar
vingança em favor do seu povo amado. Nunca é sábio desafiar a Deus. Muitos, por
não saberem que “horrível coisa é cair
nas mãos do Deus vivo” (Hb 10.31), o desafiam e experimentam esta verdade
na pele. Por incrível que pareça, até mesmo cristãos fazem isto. Será que não é
hora de refletir sobre se estamos ou não desafiando o nosso Deus? Será que
quando estamos destruindo a paz da Igreja de Cristo não estamos nos
assemelhando aos edomitas e atraindo a ira de Deus?
Vemos aqui o grande amor e preocupação de Deus
com seu povo. Este aspecto do nosso Deus também precisa ser destacado. É
indispensável falarmos sobre a ira de Deus, as maldições da aliança, a
necessidade de arrependimento, etc. Mas também se faz necessário salientarmos a
bondade de Deus com a qual o seu povo é abençoado. O fato de Deus ser bondoso é
motivo de alívio para nós, e na Escritura isto é ensinado para conforto nosso.
Como reformados temos a tendência de enfatizar apenas a severidade de Deus,
porém ele não é apenas ira e vingança. Ele é graça, misericórdia, bondade, etc.
Veremos agora mais uma ameaça quanto à destruição de Edom.
2.3
NÃO HAVERÁ ESCAPATÓRIA PARA EDOM
Através
do profeta, o Senhor faz ecoar a mensagem de que o castigo era inevitável. Não
há mais nada que Edom possa fazer para aplacar a ira divina. Edom era uma nação
extremamente soberba e altiva. Por se localizar em uma região montanhosa, com o
acesso dificultado para inimigos de guerra pelos vales estreitos e os grandes
penhascos, eles se consideravam imbatíveis.
A questão que ficou para os edomitas era que
para Deus não há gigante, forte ou poderoso. O profeta vai dar a certeza de que
ainda que eles se elevem até os céus, lá onde ficam as estrelas, o castigo de
Deus irá alcançá-lo.
O Senhor Deus pune os soberbos. O sábio diz
em Provérbios 16.18: “A soberba precede a
ruína, e a altivez do espírito, a queda.” Não é preciso dizer que a soberba
é incompatível com as virtudes que devem nortear a vida dos cristãos. A
simplicidade do evangelho e o exemplo maior de humildade que já houve no mundo
– o nosso Senhor Jesus Cristo – são provas disso.
A ruína estava prestes a acontecer. A
terrível cólera de Deus estava para ser derramada sobre esta nação profana e
ímpia. O povo de Judá não podia submeter os edomitas a uma derrota desta por si
só. Por isso o soberano Deus levantou-se do seu santo trono em favor de seu
povo. Isto deve trazer-nos a lição de que devemos nos valer apenas do nosso
Deus quando o perigo nos rodear. É exatamente assim que Calvino termina seu
comentário deste trecho do livro. Ele nos ensina a que nós, mesmo em meio às
perseguições que sofremos, não cessemos nunca de invocar o santo nome de Deus.
É muito estranho quando ouvimos relatos de
pessoas que, apesar de estarem há tanto tempo na Igreja, de serem aparentemente
tão experientes na vida cristã, não obstante tudo isso são tão frágeis que não
suportam o sofrimento e logo esmorecem, quando não abandonam a fé. Parece que
tais pessoas esperam por uma vida que nunca lhes foi prometida na Bíblia. As
Escrituras ensinam com muita clareza que no mundo todos haveremos de passar por
aflições (Jo 16.33). O ensino que devemos retirar disso é de que precisamos
aprender a confiar em Deus, que é o nosso refúgio (Sl 46.1).
Deus prometeu derrubar a nação de Edom, ainda
que eles se elevassem até às estrelas. Deus também promete que dará cabo de
todos os ímpios no último dia, quando nosso Senhor Jesus Cristo retornar a este
mundo para, de forma gloriosa e triunfante, estabelecer o estado eterno de
felicidade do Seu povo. Nisso deve repousar nossa confiança. Ainda que eles nos
submetam à terríveis torturas (como fizeram os edomitas aos israelitas), o fim
que para eles está reservado é incomparavelmente mais horrendo. Cristo disse
que não deveríamos temer os que matam o corpo, mas não podem fazê-lo com a
alma, mas que deveriam temer Àquele (Deus) que é capaz de fazer isto.
3. A DERROCADA DE EDOM
3.1
A DESTRUIÇÃO SERÁ COMPLETA
Duas perguntas são feitas no início
do versículo 5. Essas perguntas não retratam a realidade do que irá suceder ao
povo de Edom, apenas a ilustram parcialmente. O profeta nos conduz a um
pensamento acerca do que ocorre em dois casos específicos. O primeiro é
bastante comum às sociedades em todas as épocas. Ele mostra o que acontece
quando ladrões, a noite, roubam os bens de outrem. Semelhantemente, fala sobre
cachos (provavelmente tendo em mente uvas)
sendo colhidos por vindimadores.
Como
Calvino acertadamente comenta, Deus não se contentaria com apenas um saque de
parte dos bens de Edom. As riquezas seriam completamente extraídas.
Um
ladrão, pela natureza de sua prática criminosa, leva apenas aquilo que
considera suficiente. Ele pode se esforçar por roubar o máximo que ele puder, mas ele não é capaz de levar tudo. A segunda
metáfora usada é a da colheita de uvas. Os colhedores também não levavam tudo, muito
em obediência a uma lei encontrada em Levíticos 19.10. Vemos o cumprimento
dessa lei no caso de Boaz e Rute, quando aquele ordena a seus servos que deixem
algumas espigas no campo para que ela apanhe (Rt 2.8-23).
Este
seria um saque diferente. Ao contrário daqueles corriqueiros, os assírios, povo
que foi escolhido por Deus para aplicar seu juízo contra Edom, iriam devastar
completa e impiedosamente este. Deve nos conduzir a uma indizível admiração
este fato! De maneira espantosa, Deus estava castigando uma nação que havia
consentido e participado na destruição do povo da aliança. Assim devemos olhar
para o nosso Deus hoje também, como o Deus gracioso que provê proteção e
livramento para os seus fieis.
O
que nós claramente podemos entender acerca da analogia feita pelo profeta é que
tudo seria devastado em Edom, as casas, as propriedades, etc. Tudo seria
saqueado sem que nada restasse. Este oráculo representa tanto uma séria ameaça
e motivo de terror por parte dos edomitas, como uma mensagem de alívio e de
justiça para o povo de Deus, que havia sido massacrado.
Dillard
e Longman lembram que o oráculo de Obadias, assim como os dos demais profetas,
apresenta três elementos importantes: 1)
A proclamação da Lei universal de Deus, o que significa que o Deus de
Israel é o Deus de toda a terra, ao contrário dos falsos deuses que “reinavam”
apenas nas nações onde eram cultuados; 2)
A expressão da aliança abraâmica, de acordo com a qual Deus promete
abençoar quem abençoasse o seu povo e amaldiçoar quem o amaldiçoasse (Gn 12.3);
e 3) A ideia da guerra santa, onde o
povo de Deus tem consciência do dever de, se necessário for, fazer guerra
contra os seus opressores.
No
versículo 6 o profeta continua proclamando como a terra de Edom seria
espoliada. Como que pasmado pelo que ocorreria com este povo, num estilo de
canto fúnebre , Obadias exclama: “Como foram rebuscados os bens de Esaú!”.
De maneira que muitos naqueles dias talvez não entendessem, foram “esquadrinhados todos os seus tesouros
escondidos!”. A Bíblia de Jerusalém traduz o verbo “esquadrinhado” por
“explorado”. O sentido é de que tudo foi revirado, sem que nada restasse. O
profeta apenas enfatiza o que já havia dito. A devastação seria completa.
O
povo certamente ficaria perplexo com este acontecimento porque era difícil
imaginar como Edom, tão forte, poderosa e quase impossível de ser vencida numa
batalha seria tão grandemente humilhada. Isto é possível quando o Deus que
exalta as nações se levanta do seu trono com o intuito de abatê-la. Humanamente
seria complicado imaginar tal façanha, mas para Deus não existe impossível (cf.
Lc 1.37). Este evento era tão certo que o profeta coloca o tempo no passado. É
como se ele tivesse contemplado essa visitação divina em ira. Veremos na
próxima parte o que mais estava por vir sobre a ímpia nação de Edom.
3.2
EDOM SERÁ TRAÍDA PELOS SEUS ALIADOS
A ação mediata de Deus para que Edom
fosse derrotada seria a traição. O verso 7 indica isto. Como diz Wiersbe, “o
Senhor agiria de modo que as alianças com Edom fossem rompidas” . Mesmo sendo fortificados
geograficamente, eles precisavam de alianças com outras nações que a ajudassem
a se proteger contra os impérios que atacavam os povos do leste .
Obadias
diz que “Todos os teus aliados te
levaram para fora dos teus limites”. Deus age de maneira tremenda fazendo
com que, de repente, em uma nação antes imbatível, tudo começasse a dar errado,
de forma que até mesmo os seus amigos se voltassem contra ela. A primeira ação
foi a de levar Edom para fora de suas
fronteiras e assim a expor aos ataques do inimigo; o profeta descreve mais
três, quando diz que “enganaram”, “prevaleceram” e “puseram armadilhas” para Edom.
Interessante
é que os pactos realizados entre as nações eram feitos em um ambiente amigável,
com direito a banquetes. Estabelecia-se, assim, um acordo mútuo entre os
aliancistas. Como Edom poderia escapar do juízo de Deus se agora até os seus
aliados viraram seus inimigos? A Igreja deveria aprender com este exemplo a
lição de que nunca deveria confiar em pecadores, ainda que estes lhe jurassem
fidelidade pactual. A nossa confiança deve estar apenas em Deus, o único que,
uma vez tendo estabelecido aliança com o homem, garante “com a sua vida” que
nunca irá quebrá-la (cf. Gn. 15.10,17).
Diante
disto, a pergunta pertinente é: em quem ou em que o povo de Deus tem confiado?
Temos nós dependido apenas de Deus para a resolução dos conflitos contra os
nossos inimigos? Será que o todo-poderoso, criador dos céus e da terra, o autor
da vida e de tudo o que existe é suficiente para nele depositarmos nossa
esperança? Haveria algo mais a acontecer que enfraquecesse os edomitas para que
então fossem dominados e destruídos? Na sequencia, veremos que Deus ainda
diminuiu a força deste povo para abatê-lo.
3.3
EDOM SERÁ DESTITUÍDA DE SABEDORIA E FORÇA
Até
mesmo a sabedoria fora retirada dos edomitas. O profeta diz na parte final do
versículo 7 que “não há em Edom
entendimento”. Edom era caracterizada pela sabedoria proverbial, prudência
política e coragem . Yahweh aplica mais um duro golpe
neste povo, fazendo com que seu entendimento fique obscurecido. Isto chegou a
tal ponto que eles foram incapazes de perceber a armadilha que contra ele foi
armada.
Não
existe nenhum empecilho para Deus quando ele decide agir. Ele já havia
enfraquecido a terra de Edom, mas ainda precisava destituir este povo de
inteligência para que a sua ruína se estabelecesse. Como são tolas as nações
que confiam em suas alianças políticas e se esquecem do controle soberano de
Deus sobre todas estas relações! Não existe aliança inquebrável para Deus a não
ser a que ele impõe.
O
servo de Deus faz, no versículo 8, uma pergunta retórica, e nela ele usa um
paralelismo: “Não acontecerá, naquele
dia, diz Yahweh, que farei perecer os sábios de Edom e o entendimento do monte
de Esaú?”. É certo que Deus fará isto! O seu juízo se manifestará através
de todas estas desgraças que vêm sendo anunciadas por Obadias. Os edomitas
seriam frustrados com a “retirada” de sua inteligência e sua inevitável
derrocada. O orgulho e a altivez deste povo faziam co que eles olhassem para si
mesmos de maneira soberba. Sua sabedoria era terrena, não vinha do alto, que é
a verdadeira sabedoria (Tg 1.5).
A
sabedoria que é fruto de uma reflexão distanciada da revelação bíblica é
soberba diante de Deus. Além disso, ela conduz à idolatria. Em Romanos 1.21-22
está escrito: “porquanto, tendo
conhecimento de Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças;
antes, se tornaram nulos em seus próprios raciocínios, obscurecendo-se-lhes o
coração insensato. Inculcando-se por sábios, tornaram-se loucos”. Esta
sabedoria anti-bíblica levou Edom à destruição.
No
verso 9 finaliza-se o que estava para acontecer com Edom, e o fim descrito pelo
profeta é trágico! Ele diz: “Os teus
valentes, ó Temã, estarão atemorizados”. Temã era a cidade mais importante
de Edom. Os valentes de que fala o profeta eram os militares, já que esta
cidade possuía um exército poderoso. De uma forma assombrosa, Deus os encheu de
temor e os tornou vulneráveis, presas fáceis para os inimigos.
A
história registra que os árabes invadiram Edom e tomaram as cidades. Nada mais
daquela antiga Edom dominadora e soberana restava. Os edomitas foram totalmente
vencidos. Muitos fugiram para outras regiões, como o deserto do Neguebe, por
exemplo. Vemos aqui que o “feitiço voltou contra o feiticeiro”, e aquilo a que
os edomitas sujeitaram o povo de Deus lhes sobreveio. Deus lhes deu a paga com
a “lei de talião”!
O
Deus de Israel, que é também o Deus da Igreja e o único do universo, deve ser
temido e adorado! Seus grandes feitos na história estão registrados para que os
seus eleitos nunca se esqueçam disso. É importante destacar isto. Parece que
nos esquecemos da grandiosidade de Deus, de seu poder ilimitado e da excelência
de seus desígnios. Levamos uma vida indiferente a estas realidades, não parece
que somos os herdeiros de todas as promessas deste Deus.
O
temor que haverá de tomar conta dos valentes homens de guerra de Temã tem um
propósito, que é descrito pelo profeta: “para
que, do monte de Esaú, seja cada um exterminado pela matança”. O fim
nefasto dos edomitas é relatado de maneira assustadora! Segundo as palavras do
servo de Yahweh, ninguém escapará da
matança. Todos serão dizimados.
Calvino
traduz a palavra “matança” (heb. katel)
por carnificina. Ele nos lembra que ela significa uma matança na qual ninguém
permanece vivo . Seria algo impressionante essa
experiência que seria vivenciada pelas nações que conheciam Edom. Como, tão
repentinamente, este povo forte e imbatível em suas batalhas foi tão
rapidamente reduzido a cinzas? Que poder seria este, capaz de abalar o
inabalável? Nada a na ser o Deus onipotente, que a todos subjuga, seria capaz
de promover tal acontecimento.
O
profeta Obadias ainda irá continuar, nos versículos posteriores (precisamente
até o 14) a proferir as ameaças da parte de Deus contra os edomitas. Todavia,
aquilo que até aqui fora registrado é suficiente para mostrar como Deus não tem
o culpado por inocente, e preza por fazer justiça ao seu povo eleito. É suficiente
para revelar como Deus faz cumprir sua promessa na aliança abraâmica de
amaldiçoar quem amaldiçoasse seus filhos. Bendito seja ele por isto!
4.
OS PECADOS DE EDOM
4.1
EDOM ALIOU-SE AOS INIMIGOS DE JUDÁ
Como já indicado, a partir do verso
10 Obadias apresenta as razões pelas quais Deus impôs aos edomitas os castigos
mencionados no seu livro. O verso 10 fala da “violência” dos edomitas contra os israelitas. O profeta aqui
acentua a crueldade dos edomitas quando acrescenta a palavra irmão. Ele mostra com isso que o fato de
serem eles irmãos não foi suficiente para fazer com que Edom não usasse de
violência. O pecado em si já era condenável, e o fato de haver este laço
familiar fazia com que o crime cometido se tornasse ainda mais grave.
Este
relato nos mostra com toda clareza que linhagem histórica não significa
filiação divina nem aponta para a santidade. Se este fosse o caso, os edomitas
não seriam tão ímpios como vemos na profecia de Obadias. Não é por causa de uma
ascendência santa que alguém prova ser cristão genuíno, mas o recebimento da fé
verdadeira é quem determina essa realidade. Lamentavelmente, muitos entre nós
estão se gabando de suas raízes históricas e esquecendo-se do que realmente
importa no cristianismo, que é a sua vida prática, já que até mesmo das pedras
“Deus pode suscitar filhos a Abraão”
(Mt 3.9).
De
acordo com o texto, esta violência traria duas conseqüências. A primeira delas,
diz o profeta, é que eles seriam cobertos pela vergonha. O que faz com que Deus
seja tão severo na aplicação da punição? Existe algo no texto que nos indica
essa resposta. Calvino, com o brilhantismo que lhe é peculiar, comenta que o
propósito de Deus chamar os israelitas de irmãos dos edomitas era “declarar de
forma mais completa a crueldade dos idumeus; pois a consangüinidade não tivera
nenhum efeito para os impedir de se enfurecerem contra os próprios irmãos e, no
modo de dizer, contra as próprias entranhas.” Não era contra uma nação
estrangeira, inimiga e destruidora que Edom estava se insurgindo. Na verdade,
eles se aliaram a uma nação com estas características. Eles tiveram uma atitude
oposta àquela que deles se esperava, por se tratar de um flagelo infligido a
seus próprios irmãos.
A
atitude dos edomitas foi abominável! O Senhor Deus, o santo Deus de Israel,
jamais deixaria este crime horrendo impune. Deus não tolera o pecado. Apesar de
até mesmo este servir aos seus propósitos, não obstante ele pune severamente os
que vivem na prática do pecado. Por conta disto, primeiramente eles seriam expostos
à “vergonha”. Sua humilhação seria
pública, assim como o foi a dos israelitas. Eles seriam cobertos pela vergonha. É uma maneira de expressar que eles seriam
grandemente envergonhados. A segunda consequencia é ainda mais severa. “Serás exterminado para sempre”. A
palavra “exterminado” é traduzida de outras formas nas várias traduções. Eis
algumas: eliminados (NVI e Edição
Pastoral), destruídos (NTLH), exterminados (ARC, ARA e Bíblia de
Jerusalém) e perecerás (Peregrino).
Todas elas apontam para um fim terrível reservado para este povo. Deus levaria
à cabo o que ele estava sentenciando contra Edom. Aqueles que acham que a
paciência de Deus nunca tem fim deveriam olhar para a destruição de Edom e
tremer diante dele. Assim foi com eles, assim será na consumação de todas as
coisas, quando chegarmos ao ápice do eschaton
e o Senhor banir de sua face santa os ímpios para todo o sempre!
Quanto
tempo duraria o castigo dos edomitas? Algumas horas? Dias? Anos? O texto diz “para sempre”. A situação era
irreversível. Deus não os pouparia, nem atenuaria sua punição, mas a aplicaria
de modo permanente sobre eles. Como já foi comentado anteriormente, tal foi a
sorte deles, totalmente exterminados e eliminados da terra. Alguns, como o Dr.
Russel Shedd, afirmam que isto se cumpriu no ano 70 D.C., com a conhecida
destruição da cidade de Jerusalém. Outros afirmam que o cumprimento desta
profecia foi bem antes, logo após o cativeiro. O fato é que ninguém sobrou da
linhagem de Esaú. Deus é zeloso de sua palavra. Ele jamais falaria algo que não
viesse a acontecer como ele revelara. E assim, da mesma forma que os edomitas
não levaram em consideração seu “parentesco” com Israel, Deus os castigou e os
baniu da terra mesmo sabendo de tal proximidade genealógica.
No versículo 11, o profeta revela a
natureza e a dimensão da maldade dos edomitas: “No dia em que, estando tu presente, estranhos lhe levaram os bens, e
estrangeiros lhe entraram pelas portas e deitaram sortes sobre Jerusalém, tu
mesmo eras um deles.” Os “estranhos” a que o texto se refere são os
babilônios, que invadiram Jerusalém e a arrasaram. O exército babilônico
invadiu Judá e devastou-a, destruindo tudo e saqueando o que podiam. Qual foi a
postura dos edomitas diante disso? Eles ajudaram os judeus? Muito pelo
contrário, eles se aliaram ao exército de Nabucodonosor. Wiersbe comenta a
natureza hedionda do crime cometido contra os israelitas dizendo que os
edomitas “ficaram nas encruzilhadas, prontos para pegar qualquer um que
tentasse escapar; e entregaram os fugitivos ao inimigo para que fossem presos
ou mortos.”
A
palavra que define a atitude de Edom é traição.
O que se espera de povos irmãos é tratamento afetivo mútuo. Edom aliou-se a um
povo constituído de ímpios para perpetrar o mau contra seu irmão. Isto mostra a
natureza vil do coração não regenerado. Mostra que o homem sem Deus é capaz de
praticar os absurdos mais inimagináveis. Porém, não é verdade que pessoas que
se dizem cristãs muitas vezes nos surpreendem com atitudes que delas não
esperávamos? Não estamos cansados de ver exemplos de verdadeiros traidores que
estão no meio do povo de Deus? Será que nossas comunidades não estão cheias de
“edomitas”?
Como
Calvino comenta, eles podiam apresentar a Deus a desculpa de que não foram os
responsáveis diretos pela destruição de Judá, e por isso não tinham culpa
alguma. Eles foram coniventes. O texto enfatiza que Edom “estava presente”.
Foi, de fato, uma atitude inaceitável da parte dos edomitas. Mas o soberano
Deus, que é justo e não tolera o pecado, não deixaria tal barbárie impune. Ele
iria levantar-se do seu sublime trono e aplicar a sua justiça. Mas antes disso,
ele levanta o profeta para “embasar juridicamente” esta punição.
4.2 EDOM ALEGROU-SE COM A RUÍNA DE
JUDÁ
O servo de Deus Obadias passa agora a
apontar as atitudes abomináveis praticadas pelos edomitas contra seus irmãos de
Judá, enfatizando que eles não deveriam ter
feito o que fizeram. Oito vezes o profeta repete a expressão “não devias”, do
versículo 12 até o 14. Esta estrutura é semelhante à dos dez mandamentos, onde
as proibições são feitas com o uso do advérbio de negação (não) seguido de um
verbo. Por esta razão, alguns traduzem esta passagem de maneira semelhante aos
mandamentos (ex: “não olhes..., não te alegres... etc.) A primeira coisa que
eles não deveriam ter feito contra Jacó era “ter olhado com prazer para o dia de teu irmão”.
O pecado havia de tal
forma dominado o coração dos edomitas que eles agora não apenas têm uma postura
passiva com relação ao sofrimento de seus irmãos, como alegram-se, sentem
prazer, exultam com a desgraça deles. E não era prazer por algo sem muita
significância; tratava-se do “dia da sua
calamidade”. O pecado torna as pessoas insensíveis à dor humana. As pessoas
passam a sentir-se felizes com o sofrimento e a desgraça alheias. O caso dos
edomitas tem o agravante de que tal felicidade tem como motivo o sofrimento e a
desgraça vivida por seus irmãos!
Em se tratando de ímpios,
atitudes abomináveis como estas são até compreensíveis. Mas o que dizer quando
este tipo de coisa é vista entre o povo da aliança? Isto é compatível com um
povo santo, separado por Deus para praticar obras de justiça? Se o que é reto e
justo não for visto entre estes, de onde devemos esperar a prática justiça? Em
nossos dias, para tristeza nossa, muitos são os que, contrariando as obras que
os deveriam caracterizar, têm se assemelhado a estes edomitas, deleitando-se
com as aflições experimentadas por seus irmãos na fé. Essas pessoas não são
diferentes dos edomitas. Pelo contrário, por serem povo da aliança (ao menos em
tese), seu pecado é ainda mais grave!
A segunda coisa que Edom
não deveria ter feito era ter-se “alegrado
sobre os filhos de Judá, no dia da sua ruína”. Aqui temos a mesma
substância da acusação anterior. A gravidade do crime apontado é a mesma. No
terceiro apontamento do profeta temos a mesma estrutura. O profeta diz que eles
também não deviam “ter falado de boca
cheia, no dia da angústia”. Observa-se aí de maneira clara a existência de
um paralelismo: eles tiveram prazer/se alegraram/falaram de boca cheia. Isto
tudo em relação a seu irmão/filhos de Judá no dia de sua
calamidade/ruína/angústia. Também é importante observar que o profeta faz
questão de destacar o sofrimento do povo de Deus. A insensibilidade de Edom é
tão grande que esta nação permaneceu irredutível, mesmo contemplando uma
devastação de tão grandes proporções sofrida por seus irmãos.
Comentando a expressão
“de boca cheia”, D.L. Moody diz que isso significa que eles “se vangloriaram
diante dos outros sobre o fato dos israelitas merecerem o seu castigo. Assim, à
injúria acrescentaram o insulto.” É extremamente difícil imaginar uma
cena desta! O povo cujos laços com Israel deveriam ser de fraternidade estava
sendo acusado de zombar da destruição daquele povo! Israel merecia o castigo
que estava recebendo, pois foram a consequencia de seu pecado. Mas isso não
justifica a atitude dos idumeus. Eles não deveriam ter-se comportando assim.
Mas a sua postura diante desse caos, no fim das contas, constituiu-se na sua
própria perdição, pois Deus, que não deixa o pecado impune, trataria com eles
posteriormente. Restava apenas ao povo de Deus aguardar a resposta divina para
tudo que estava acontecendo. Porém, as acusações ainda não acabaram. O profeta
ainda tem algo a dissecar sobre o coração demasiadamente corrupto dos
edomitas.
4.3 EDOM PARTICIPOU ATIVAMENTE DA
DESTRUIÇÃO DE JUDÁ
No verso 13 seguem-se as acusações.
Esta é a quarta. Obadias diz: “não
devias ter entrado pela porta do meu povo, no dia da sua calamidade”. Isto
mostra que os idumeus participaram ativamente
desta cruel pilhagem da cidade de Jerusalém, e não apenas como meros
expectadores. Nas palavras de Wiersbe, “os edomitas entraram na cidade e
participaram da divisão dos espólios e, desse modo, roubaram a riqueza de seu
irmão.” Com isto, eles estavam juntando-se
aos algozes dos judeus, formando com eles um exército que caminhava para
destruir a cidade santa. Na quinta acusação temos uma repetição do conteúdo da
primeira, onde o profeta disse que eles não deveriam “ter olhado com prazer” para aquela calamidade. Cada vez que o
profeta aponta um pecado específico dos edomitas, a impressão é de que os
edomitas descem mais e mais a uma condição de trevas espirituais que os levam a
cometer atrocidades cada vez mais alarmantes.
Neste
mesmo versículo o profeta ainda diz que Edom não devia “ter lançado mão nos seus bens”. Esta sexta acusação revela-nos que
outro crime praticado pelos edomitas contra Jacó foi o saque de suas riquezas.
Mais um pecado bárbaro sujava ainda mais as já contaminadas mãos edomitas.
Assim como eles, muitos são os que estão entre nós e cultivam o acúmulo de
pecados. É pecado em cima de pecado. Quanto mais praticam, mais querem. E pior,
ainda variam. Depois estes mesmos não sabem o motivo do castigo bater as suas
portas! Eis aqui uma advertência para nós: se estamos acumulando pecado, não
devemos esperar que a punição que virá da parte do Senhor seja desproporcional
à eles. Não será jamais! Deus irá nos castigar até que sua ira seja saciada.
Pensemos nisto antes de transgredir sua santíssima Lei!
A
sétima e penúltima denúncia está no versículo 14: “não devias ter parado nas encruzilhadas, para exterminares os que
escapassem”. Calvino esclarece a ideia presente neste trecho. Ele diz que
“os idumeus ocuparam todas as vias para interceptar os miseráveis exilados, aos
quais a fuga era o único meio de segurança.” O tamanho da traição aumenta a cada
denúncia do profeta. O que se nos mostra agora é que as rotas de fuga de Jerusalém
foram todas fechadas pelos edomitas, ou seja, eles queriam garantir que os seus
irmãos não escapariam da destruição.
A
última denúncia era o golpe final da maldade de Edom contra os israelitas. Edom
não devia “ter entregado os que lhe
restassem, no dia da angústia.”. A crueldade de Edom não tem limites. Não
há o menor pudor. “Os que lhe restassem” é uma referência aos que porventura
escapassem do cerco. Não era pra ninguém ficar de fora da matança. Não deveria
haver exceção, todos os judeus deveriam experimentar a escravidão no exílio ou
a morte! Após tudo isso, podemos dizer que o único diagnóstico possível para os
idumeus é que estão mortos! Mortos espiritualmente. Não há mais temor a Deus
nem amor ao próximo, ainda que este próximo seja seu próprio irmão! Que
condição miserável! Que deploração! Esta é a condição de todos os ímpios ainda
hoje! Mas, assim como o dia do Senhor chegou para os edomitas, e estes foram
extintos, o Dia do Senhor, o dia específico que colocará um ponto final na
história, este dia será de pranto e ranger de dentes para os inimigos de Deus e
de sua Igreja. Que este dia chegue. Maranata!
5.
O GRANDE E TEMÍVEL DIA DO SENHOR
5.1
SERÁ UM DIA DE IRA SOBRE OS INIMIGOS DE DEUS
O
profeta faz referência a um tema recorrente no Antigo Testamento: o “Dia do SENHOR”. Esta expressão aparece
em vários textos proféticos (Jl 2.31; Sf 1.7,14; Zc 14.1; Ml 4.5, etc.) e
apontam para um dia, separado por Deus na história, para o acerto de contas. É
um dia em que o povo que está para ser julgado há de encontrar-se com o Todo
Poderoso para que este o julgue. Aqueles que praticam a justiça recebem a
recompensa por isso, todavia, os que fazem aquilo que é mau aos olhos do
supremo Juiz recebem a justa punição pelos seus pecados. O dia do SENHOR do
nosso texto tem estas duas aplicações.
Obadias
nos diz que este dia “está prestes a vir”.
A justiça de Deus nunca é atrasada. Ela vem no tempo certo, pois o tempo certo
é aquele que Deus determina. O genuíno servo de Deus deve considerar o tempo
estabelecido por Deus para a execução de seus soberanos propósitos, e não o
tempo dos homens, que é carregado de uma sede egoísta e pecaminosa de vingança.
Deus, a seu tempo, levantar-se-á do seu trono e agirá no tempo e na história
com justiça. Como diz Calvino, “o Senhor não se apressa segundo a maneira dos
homens; mas, paralelamente, conhece suas estações, e isso sempre se realiza,
para que, quando os ímpios se julgarem estar em descanso, a súbita destruição
então os acometa.”
Quando este dia chegar, a “lei da
semeadura” será posta em prática. Nas palavras proféticas, “como tu fizeste, assim se fará contigo; o
teu malfeito tornará sobre a tua cabeça.” O Senhor garante que as más ações
cometidas pelos ímpios edomitas não ficarão sem a devida e justa retribuição,
visto que Deus não é como os homens, que muitas vezes fazem vista grossa ao
erro e ao pecado. Deus pune o pecador independente de qualquer coisa.
Independente até mesmo de se tratar ou não de um servo seu. O rei Davi, embora
fosse um homem “segundo o coração de Deus”, não escapou do castigo divino
quando cometeu adultério com Bate-Seba e assassinou Urias. Deus, por meio do
profeta Natã, disse a Davi: “Eis que da tua própria casa suscitarei o mal sobre
ti, e tomarei tuas mulheres à tua própria vista, e as darei a teu próximo, o
qual se deitará com elas, em plena luz deste sol.” e ainda “... posto que com
isto deste motivo a que blasfemassem os inimigos do SENHOR, também o filho que
te nasceu morrerá.” (2ª Samuel 12. 11,14).
O
texto fala a respeito daquilo que o Senhor anuncia que fará aos ímpios algozes
do seu povo. O interessante é que estamos analisando a segunda parte do livro,
que se inicia no versículo 15 e fala da restauração do povo de Deus. E faz
parte deste oráculo de salvação o anúncio da destruição dos pecadores. Isto nos
ensina que a mensagem de esperança do povo eleito não diz respeito apenas à
bem-aventurança que os aguarda, mas à aniquilação dos incrédulos. Isto nos
ensina que devemos nos alegrar também com a aplicação da justa ira divina sobre
seus inimigos. Não uma alegria perversa e egocêntrica, mas uma alegria por ver
os atributos da santidade e da justiça divinas sendo vindicados. Alegremo-nos,
pois o Senhor, no dia do acerto de contas, proclamará através da punição que
será aplicada aos impenitentes que ele é santo, justo e bom!
No versículo 16, o profeta usa uma
linguagem simbólica para falar da ira de Deus sendo aplicada. Diz ele que “como bebestes no meu santo monte, assim
beberão, de contínuo, todas as nações”. A ideia é de dizer que, assim como
os idumeus destruíram Jerusalém e alegraram-se grandemente com isso, por essa
causa, eles haveriam de beber do cálice da ira de Deus até a última gota. A
realidade da punição divina que será aplicada com toda a sua intensidade e de
maneira irreversível é assombrosa! As Escrituras deixam claro que, uma vez
findado o tempo de se achar graça e perdão, completado o período escatológico
predeterminado pelo Senhor, os ímpios serão castigados de uma maneira nunca
antes experimentada por quem quer que seja. Diante disso, torna-se mais que
evidente a loucura da vida dos homens que estão distantes de Deus.
Esta
punição será tão severa que o profeta diz que eles “beberão, sorverão e serão como se nunca tivessem sido”. Em outras palavras,
a destruição será tal que, ao seu término, será como se eles nunca tivessem
existido. Apenas as memórias de Edom é que restarão. Estas coisas servem tanto
para a advertência dos ímpios e pecadores quanto para o alento do povo de Deus.
Conforme comenta Wiersbe, “não importa quão desalentador o presente possa
parecer ao povo do Senhor, há um Deus justo no céu que retribui aos pecadores
conforme seus pecados: aquilo que fizeram aos outros, isso lhes será feito.”
O
versículo 18 faz um contraste entre o que está para acontecer com a casa de
Jacó e a de Edom. Então o profeta diz que “a
casa de Jacó será fogo, e a casa de José, chama, e a casa de Esaú restolho”.
Deus aqui garante que o seu povo, até então estando como que reduzido a cinzas
por causa de sua destruição, seria reerguido e se transformaria em verdadeiras
labaredas. Já o destino dos idumeus seria exatamente o oposto: tornar-se-iam em
palha, em cinzas, em restos (esses são os sentidos de “restolho”). O profeta
ainda realça esta ideia dizendo que eles seriam consumidos e que “ninguém mais restará da casa de Esaú”.
Já vimos outras, mas esta é mais uma referência à total destruição e extinção
dos edomitas. Eles não sobraram. Não há mais nenhum deles para manter a sua
memória; foram completamente apagados do mundo pelo poder de Deus.
Tudo
isso haveria de acontecer por uma razão, apontada pelo texto. A razão é: “porque o SENHOR o falou”. Como bem
expressou o príncipe dos pregadores Charles Spurgeon, “o Senhor fala com uma
boca que nunca falha”. Não foram homens que falaram ou prometeram. Foi o
soberano Deus de Israel quem o disse, e quando ele fala nenhuma só palavra cai
por terra. Tudo se cumpre integralmente. O tempo em que o Senhor Deus fará
exatamente assim a todos os ímpios
está vindo. Que as nações temam diante desta informação!
5.2
SERÁ O DIA DA ANSIADA SALVAÇÃO DO POVO DE DEUS (vv. 17, 19-21)
Aqui encontramos a solene promessa de
livramento para a Igreja de Deus. Aos santos de Deus cruelmente destruídos
pelos babilônios, com a perversa colaboração da nação de Edom, é prometida a
libertação e salvação de suas mazelas. Obadias diz que “no monte Sião, haverá livramento”. O monte Sião sempre foi tido
pelos escritores bíblicos como o monte santo, o monte onde Deus se fazia
presente graciosamente. Em Isaías 2.3 está escrito: “Irão muitas nações e dirão: vinde, e subamos ao monte do SENHOR e à
casa do Deus de Jacó, para que nos ensine os seus caminhos, e andemos pelas
suas veredas; porque de Sião sairá a lei, e a palavra do SENHOR, de Jerusalém.”
O
monte Sião é o símbolo da congregação de todos os verdadeiros santos de Deus no
Antigo Testamento. Em outras palavras, é o símbolo da Igreja de Cristo. Somente
na Igreja, no corpo místico de Cristo, na congregação dos eleitos de Deus, há
refúgio para os crentes. Os que estão fora desse reduto estão em apuros. Assim
como não houve escapatória para aqueles que não se refugiaram em Sião, aqueles
que estão fora da esfera do corpo místico de Cristo estão em grave situação de
risco. Por isso que é muito perigoso para qualquer crente estar longe do
convívio dos eleitos nesta vida. Por isso que o chamado movimento dos
“desigrejados” é uma aberração. O autor aos hebreus tinha a compreensão desse
perigo e por isso alertou seus ouvintes a não abandonarem suas congregações (Hb
10.25).
Em
seguida, há uma importante declaração do profeta Obadias. Diz ele: “o monte será santo; e os da casa de Jacó
possuirão as suas herdades.” A importância dessa fala reside exatamente no
verbo “possuir”, que transmite a ideia não apenas de uma tomada de determinada
coisa, de algo que se passou a ter, mas traz a ideia de possuir por direito, possuir por ser o verdadeiro dono da referida
propriedade. Os judaítas eram os donos das terras saqueadas pelos exércitos
ímpios. Esta propriedade foi violada, mas não deixou de ser real. Então a
promessa de Deus é de que eles reaveriam suas
propriedades, algo que lhes pertencia por direito. Da mesma sorte, nós, os
santos de Deus constantemente atribulados nessa vida, temos uma herança nos
céus que nos aguarda. Será o dia em que “possuiremos nossas herdades”, naquela
cidade que guarda nossa herança incorruptível (1ª Pe 1.4). Quão maravilhoso é
este ensino! O crente que deposita sua fé sem reservas no Senhor Deus e em suas
santas e benditas promessas não jamais irá se desesperar, ainda que sua luta
neste mundo seja árdua. Ele possui uma alegria no coração que é alimentada por
uma esperança que nada pode abalar!
Nos
versículos 19 e 20, temos a menção de algumas regiões geográficas que seriam
reconquistadas. Aqui há a necessidade de uma análise mais detalhada, com o
auxílio de um mapa do período, para melhor entendimento a respeito dos lugares
citados. Mas para resumir a ideia, todos a respeito de quem se diz que
“possuirão” refere-se aos israelitas, ao povo de Deus. E as terras conquistadas
são os lugares que foram tomados por ocasião da invasão de Jerusalém. O Senhor
garante que todas estas terras serão recuperadas. O mais interessante é o fato
de que Israel não teve um exército poderoso aliado para essas conquistas. A
força e a vitória deles sobre seus inimigos veio unicamente do Senhor. Independentemente
de quem seja o opositor, a vontade de Deus prevalecerá.
O
versículo 21 nos ensina que salvadores julgarão o monte de Esaú do monte Sião.
Esses salvadores são líderes que foram levantados por Deus. Eles representam o
povo de Deus. E eles são os líderes de um Reino absoluto que, nos diz o texto,
“será do SENHOR”. Eis a principal
característica desse reino: ele pertence ao
Senhor! Não é humano. Não é imperfeito. É um reino absoluto. No cumprimento
histórico, Deus levou à cabo seus propósitos e baniu da terra santa os ímpios
que ali se estabeleceram. No aspecto escatológico, Deus banirá de sua santa
face todos os ímpios (2ª Ts 1.9).
6.
CONCLUSÃO
O amor de Deus pelo seu povo é imensurável.
Movido por ele, Deus levou seu próprio Filho unigênito à morte de cruz.
Portanto, ele tem prazer em agraciar seu povo com suas bênçãos, e o castigo dos
ímpios está incluído entre estas bênçãos. Precisamos ser mais gratos a este
Deus bendito, que com tantos livramentos nos abençoa. Devemos olhar para ele
desta forma! Não é em nossa força que está o nosso socorro, mas naquele que de
fato pode nos livrar dos nossos inimigos definitivamente!
Deus não suporta a soberba das criaturas.
Isto é um grande sinal da rebeldia da criação, que deveria ter uma atitude
exatamente contrária a esta, ou seja, de humildade. Deus também destruirá toda
soberba existente nos homens. Lembremos de que, por estarmos em aliança com
Deus, ele nos pune todos os pecados condenados nesta aliança, e a soberba está
inclusa. Esta disposição repugnante não deve ser cobiçada por nós. Infelizmente
ela tem sido frequente entre alguns que estão entre nós. Que o Senhor nos livre
destes!
Nosso consolo está no fato de que aqueles a
quem Deus têm por inimigo jamais serão capazes de livrar-se das mãos do
todo-poderoso. Cedo ou tarde Deus os fará pagar por todos os crimes e todos os
pecados cometidos contra os seus santos. Esta palavra ameaça os homens cruéis
como os assassinos islâmicos que assolam a humanidade, especialmente os
americanos (principais alvos destes homens sanguinários), e outros que não
consideram a Lei de Deus. Diante dele todos haverão de prestar contas.
Assim como no caso de Edom, o que está
reservado para os ímpios, os perseguidores do povo de Deus, é uma destruição
total e completa. Assim como foi com os edomitas, não haverá quem os livre das
mãos daquele de quem ninguém pode se esconder. Nenhum sequer deles será
poupado. Não importa o quanto hoje eles pareçam fortes, sua destruição será
completa. Que nós encontremos nestas palavras consolo para as angústias que
eles nos fazem passar.
Os
ímpios muitas vezes, no afã de levarem adiante seus desígnios pecaminosos,
fazem alianças políticas com outros homens igualmente ímpios para planejarem o
mal. Deus está observando tudo isto. Muitos deles o fazem sem qualquer peso de
consciência. E muitos de nós cristãos, por acharmos que Deus está em
“silêncio”, não confiamos em qualquer livramento da parte dele. Pensamos que
tudo o que os incrédulos se propõem a fazer acaba em sucesso. Todavia, é
importante que creiamos que Deus agirá no tempo certo, pois há tempo para tudo
(Ec. 3). Em vez disso, é dever nosso confiar plenamente nas promessas da aliança
de Deus; elas jamais falharão.
Finalmente, precisamos lembrar que
Deus faz com que coisas inusitadas aconteçam para que seus propósitos se
cumpram. Ele tirou o entendimento de Edom, que, por ser uma rota comercial,
possuía informações precisas sobre como e quando deveriam agir no caso de uma
iminente guerra. Eles simplesmente não perceberam que seus aliados, com quem se
banqueteavam e articulavam suas ações, prepararam o “bote” e os traíram. Deus
muda as circunstâncias e vira o jogo. Devemos confiar em Deus de forma plena,
crendo que ele é poderoso o suficiente para tornar o mal em bem (Gn 50.20).
Devemos ter cuidado com o tipo de
aliança que estamos estabelecendo. Edom aliou-se aos inimigos estrangeiros, e
isto causou uma ruína incalculável. O exemplo deles deve alertar-nos de que
podemos estar próximos de uma repentina ruína também, da qual dificilmente
poderemos escapar. Quem são seus amigos? Com quem você faz alianças? Será que
você tem se juntado com inimigos? Lembre-se de sua posição em Cristo!
Edom
também alegrou-se com tudo o que Judá passou por ocasião de sua destruição e
deportação. Quantas vezes você, além de aliar-se à ímpios, ainda diverte-se com
a desgraça de seus irmãos em Cristo? Será que, se esta for a sua realidade,
você é diferente dos edomitas? Ou você acha que não é semelhante à eles porque
não destruiu a cidade de ninguém? Saiba que se você vive para destruir de
alguma maneira a vida de seus próprios irmãos, e ainda achar graça nisso, é
motivo mais que suficiente para Deus te castigar da maneira mais severa que
você possa imaginar. Arrependa-se, em quanto há tempo! Este é o melhor caminho
a seguir.
Se
já não é aceitável que alguém que se diz nascido de novo ser indiferente à dor
dos outros, imagine então ser responsável
por esta dor? Edom participou da pilhagem que levou à mortandade o povo de
Deus. Cuidado, o pecado cega, deixa insensível, tira o pudor, destrói! Se para
prejudicar alguém você é capaz de até mesmo juntar-se à incrédulos, precisas
urgentemente dar meia volta de arrepender-te dos teus pecados! Caso contrário,
eles te levarão para o inferno, assim como levou os idumeus. Não há outro
antídoto, apenas o evangelho transforma. Tudo o mais é destruição.
O dia do Senhor virá. Não sabemos a
hora, não sabemos os detalhes, mas a garantia bíblica que temos é de que ele
virá. E quando esse dia chegar, os inimigos de Deus, que hoje são completamente
alheios à Deus e vivem como se ele não existisse, sofrerão eternamente a
punição por seus pecados. Bendito seja Deus, que é fiel e justo e não deixará
que os transgressores de sua Lei fiquem sem a devida retribuição.
Esse
bendito dia também será de salvação para os santos de Deus. Esse é a esperança
sobre a qual a Igreja repousa em meio a um estado de caos generalizado em que
vivemos. Enquanto os homens que não têm essa esperança depositam sua confiança
em sistemas e governos humanos, os regenerados sabem que estes estão destinados
a ruir. O único Reino que será único, indestrutível, eterno e de
bem-aventurança é o Reino eterno que pertence ao Senhor. Que o Senhor abençoe,
guie e proteja a sua Igreja, para a glória do seu nome, por Cristo Jesus, o
nosso Senhor. Amém!
7.
BIBLIOGRAFIA
BRUCE,
F.F. Comentário bíblico NVI: Antigo e
Novo Testamento / editor geral F.F. Bruce; tradução: Valdemar Kroker. – São
Paulo: Editora Vida, 2008.